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Marechal Irmã Fabiane Klein

Freira rondonense fala sobre os 17 anos de vida consagrada: “Disse sim ao chamado de Deus e me sinto realizada”

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(Foto: Divulgação/Instagram)

Consagrar-se totalmente a Deus na vida religiosa pode até ser o desejo de muitos, mas é uma dádiva de poucos. No caso das mulheres, para abraçar a vida consagrada não basta dizer “quero ser freira”. É necessário um caminho de amadurecimento e de proximidade absoluta com Jesus Cristo a partir de uma experiência profunda de espiritualidade e discernimento vocacional, uma vez que, com um compromisso de pobreza, obediência e castidade, a freira viverá inteiramente para Jesus e a proclamação de Seu Reino.

A inquietação da alma para segui-Lo brota de uma experiência que vem do coração. Foi assim com Fabiane Maria Klein, missalense de nascimento, mas rondonense de coração.

Nascida em um berço com tradições no catolicismo, ela teve desde criança uma vida rica em vivências religiosas. Sentindo-se atraída pelo Senhor, foi aos 16 anos que teve certeza do chamado de Deus.

Pouco a pouco, lançou-se nos braços de Jesus e, sem medo, abraçou a sua vontade com fidelidade. Hoje, já são 17 anos de vida consagrada e uma certeza a acompanha todos os dias: “Me sinto realizada na minha missão. Sou muito feliz e livre. Encontrei a liberdade na vida religiosa”, destaca.

Em entrevista ao O Presente, durante sua passagem por Marechal Cândido Rondon, onde esteve de férias por algumas semanas na casa da mãe e dos irmãos, Fabiane contou à reportagem um pouco sobre sua trajetória vocacional, compartilhando sua vasta experiência pessoal de encontro com Cristo.

Irmã Fabiane Maria Klein é diretora da Comunidade Terapêutica Rosa Mística, da Congregação das Irmãs da Copiosa Redenção, em Ponta Grossa: “Me sinto realizada na minha missão. Sou muito feliz e livre” (Foto: O Presente)

 

IGREJA EM CASA

De família numerosa, Irmã Fabiane diz que sua vida desde cedo foi rica em vivências religiosas. “Minha mãe, quando jovem, trabalhou em um convento e pela parte do meu pai tenho duas tias freiras. Crescemos nesse ambiente, sendo parte da vida delas sempre que havia oportunidade”, relata, ela que é a mais nova de quatro irmãos.

Fabiane nasceu em Missal, teve passagens pelo país vizinho, Paraguai, pelo município de Dourados, no Mato Grosso do Sul, e morou em Marechal Rondon antes de seguir sua caminhada de formação junto à Congregação das Irmãs da Copiosa Redenção, em Ponta Grossa.

Segundo ela, a educação religiosa dentro de casa sempre foi inspiradora. “Meus pais sempre foram envolvidos na realidade paroquial, responsáveis pela capela quando morávamos no interior e a nossa casa era frequentada por padres. Essa proximidade me proporcionou a vivência do catolicismo em muitas dimensões, dentro de casa e também nas missas, novenas, rezas do terço e catequese”, detalha.

Com uma base de fé bastante forte, durante a adolescência a busca pelo sagrado partiu da própria Fabiane. “Era minha busca pessoal. Participei de grupos de jovens e retiros. Em Marechal Rondon frequentávamos a Paróquia Sagrado Coração de Jesus e tínhamos um grupo muito ativo na época. Viajávamos para longe, íamos para eventos e encontros”, rememora.

 

VOCAÇÃO

Desde muito nova, Fabiane via apenas dois caminhos em sua vida: a vida religiosa ou o matrimônio. “Existem outras questões, mas são relativas à manutenção da vida. A vocação em si, a partir da qual eu posso frutificar, só acontece nessas duas raízes. Para mim, ficou claro que Deus me chamava para a vivência da vida consagrada, ser toda Dele e não de um esposo”, comenta.

O momento derradeiro, conforme ela, é um chamado direto ao coração. “É um toque de Deus no coração da gente. Ele é um ser em relação, não está distante. Deus é um tu com quem você se relaciona”, menciona.

“A busca pela santidade foi o que mais me tocou individualmente. Ele me falou ao coração e eu disse sim ao Seu pedido. No livro do profeta Isaías, capítulo 54, diz ‘pois teu esposo é o teu Criador: chama-se o Senhor dos exércitos; teu Redentor é o Santo de Israel: chama-se o Deus de toda a terra’. Esta é a passagem que demarca o meu chamado. Eu quis ser esposa do meu Senhor” (Foto: O Presente)

 

MOMENTO DE DESCOBERTA

Fabiane tinha 16 anos e cursava o 3º ano do Ensino Médio, no Colégio Estadual Eron Domingues, quando sentiu seu chamado por completo. “As irmãs da Copiosa Redenção vieram para Marechal Rondon e participei de um retiro. Nesse retiro eu vivi uma experiência muito profunda de estar envolvida com Deus, de plena oração. Eu vi as irmãs e pude sentir a alegria de viver delas, o uso do hábito, que para mim desde ali significava algo sagrado. Aquilo me chamou a atenção e eu me senti chamada a também vivenciar a vida consagrada”, emociona-se ao lembrar.

Segundo a rondonense, o retiro foi um divisor de águas em sua vida. “Conversei com uma das religiosas, a Irmã Silvonete, a promotora vocacional na época, e ela me disse que se eu quisesse poderia ingressar no ano seguinte para iniciar a formação. Antes disso, eu tive que conversar com os meus pais”, expõe.

 

QUATRO ANOS DE ESPERA

A empolgação resumia o momento. “Contei a eles o que havia decidido e eles disseram que gostariam que eu fizesse 21 anos para tomar uma decisão mais amadurecida e que eu fizesse, antes, a faculdade”, expõe.

De acordo com Fabiane, o posicionamento dos pais foi prudente. “Dos quase 13 aos 15 anos eu fiz uma experiência em Dourados com a minha tia, junto às Irmãs Franciscanas. Por esse motivo, meus pais queriam que eu me habituasse a minha casa antes de partir novamente”, pontua. “Combinei com eles que faria o vestibular naquele ano. Caso eu não passasse, disse que iria ingressar na congregação já no próximo ano. Se eu passasse, ingressaria depois dos quatro anos”, recorda.

O ano era 1998 e Fabiane se viu aprovada no curso de Letras/Português na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Marechal Rondon. “Durante os quatro anos do curso fui fazendo acompanhamento com as irmãs da Copiosa Redenção. Ia para Ponta Grossa e Campo Mourão participar de retiros. Nesse contato, fui me aproximando cada vez mais da realidade religiosa e me sentia cada vez mais chamada e impulsionada a viver essa vida”, frisa.

Fabiane completou a graduação em 10 abril de 2003 e dias depois, 21 de abril de 2003, já estava na Copiosa Redenção iniciando a formação. “Tive tempo para amadurecer e assim o fiz, consolidando a minha decisão e o meu destino assim que pude”, assegura.

Com 22 anos, ela ingressou no noviciado. Um ano depois, em dezembro de 2005, fez os primeiros votos de castidade, pobreza e obediência. “Com 30 anos, dia 08 de dezembro de 2012, fiz os votos perpétuos, que significam perseverar até a morte vivendo castidade, pobreza e obediência”, conta.

 

DESEJO PRÓPRIO

Ainda que nascida em um berço com tradições no catolicismo, ela afirma que não houve nenhum tipo de pressão ou influência para que optasse pela vida religiosa. “Meus pais sempre deram liberdade em nossas escolhas, tanto que minha irmã, aos 17 anos, decidiu viver fora do país e, desde então, a visitamos na Áustria. Eu tive o aprendizado da fé em família, mas nenhuma influência no sentido de ‘seja isso’ ou ‘seja aquilo’”, ressalta.

Segundo Fabiane, o desejo pela vida religiosa é fruto de uma experiência pessoal com Deus. “A busca pela santidade foi o que mais me tocou individualmente. Ele me falou ao coração e eu disse sim ao Seu pedido. No livro do profeta Isaías, capítulo 54, diz ‘pois teu esposo é o teu Criador: chama-se o Senhor dos exércitos; teu Redentor é o Santo de Israel: chama-se o Deus de toda a terra’. Esta é a passagem que demarca o meu chamado. Eu quis ser esposa do meu Senhor”, enfatiza.

 

VIDA NORMAL

Irmã Fabiane conta que durante a sua passagem por Marechal Rondon algumas situações divertidas aconteceram. “As pessoas me viam no supermercado e se espantavam. Pois é, as irmãs comem também, dormem e tomam banho, fazem coisas que todo mundo faz”, brinca, emendando: “A principal diferença do cotidiano de uma vida consagrada são os vários momentos do dia que paramos para vivência da oração. O nosso dia começa com a oração da manhã, chamada de ‘laudes’, depois tomamos o café da manhã em comunidade e então dedicamos cada uma de nós uma hora para a vivência da espiritualidade pessoal. Depois, nosso dia é em prol do trabalho com as pessoas que atendemos em nossa casa”, detalha.

 

CONGREGAÇÃO COPIOSA REDENÇÃO

A Congregação das Irmãs da Copiosa Redenção, da qual Fabiane faz parte, tem como ação social o atendimento a pessoas dependentes do álcool e das drogas. “Eu moro na Comunidade Terapêutica Rosa Mística em Ponta Grossa que atende mulheres em processo de recuperação da dependência em drogas. Eu sou diretora do espaço, cuido e organizo o trabalho dos profissionais que nos auxiliam, bem como das irmãs que estão no dia a dia com as acolhidas nesse processo”, compartilha, informando que o atendimento para recuperação pode ser encontrado pelo telefone (42) 3228-1953.

De acordo com Fabiane, há um expediente junto aos trabalhos comunitários. “No meio-dia fazemos a oração da hora média e perto das 13 horas temos a oração que chamamos de ‘visita ao santíssimo sacramento’. Às 17h15 seguimos com a liturgia das horas e rezamos o terço. À noite temos nossos espaços de vivência comunitária, formação para a vida religiosa e espaços de lazer”, expõe.

Ao contrário do que algumas pessoas pensam, a Irmã evidencia que a vida religiosa também tem momentos de descontração. “Nós vemos filmes, fazemos churrasco, vamos para praia, piscina, fazemos compras. Há muita diversão”, garante.

Questionada sobre a possibilidade de atuar em alguma paróquia católica de Marechal Rondon, Fabiane diz que isso somente seria possível se as irmãs da Copiosa Redenção estabelecessem moradia no município.

 

VIDA RELIGIOSA

Conforme ela, toda irmã consagrada, utilizando o hábito ou não, tem os votos de castidade, pobreza e obediência. “Esses são os votos que organizam a minha vida. Os fiz diante de Deus. Castidade significa viver somente para Deus; meu esposo é o meu Criador. Pobreza quer dizer que não possuo nada no meu CPF, vivo daquilo que a comunidade oferece, desapegada de qualquer pertence. Com a obediência, eu estou o tempo todo disponível quando e onde a congregação precise de mim, da minha missão”, explica.

 

CRISE VOCACIONAL

Apesar do sacerdócio ser uma opção cada vez mais incomum entre os jovens, Fabiane não considera correto dizer que há uma crise vocacional na Igreja Católica. “Há uma crise existencial em toda a sociedade, não é apenas restrita ao sacerdócio. Os jovens têm desejo de abraçar o mundo, mas, por vezes, não se aproximam de nada. Há muitas opções de distrações e isso atrapalha no crescimento dessa sementinha vocacional. Além disso, as famílias de hoje têm a fé um pouco abalada. O catolicismo já não é mais tão percebido nos núcleos familiares como era em outros tempos”, entende.

Ela pontua que antigamente havia mais pessoas ingressando na vida religiosa, contudo, observa que o número maior muitas vezes não condizia com a real vocação. “As famílias eram numerosas e muitos pais determinavam que filhos ou filhas fossem para a vida consagrada. De certa forma, havia uma imposição e, consequentemente, muitas situações em que o religioso não vivia a sua liberdade. Passamos por uma renovação da igreja e isso foi melhorado. Hoje as pessoas passam por uma experiência pessoal para decidir pela vida religiosa. As escolhas são mais maduras e conscientes”, opina. “Na nossa congregação formamos seis meninas no ano passado e em 2021 temos oito formandas. São grupos bons e frutos de uma escolha individual clara. Não temos limite de idade para o ingresso como acontece em algumas casas. Aliado a essa experiência pessoal, o processo de formação envolve um acompanhamento terapêutico, de autoconhecimento, para que a menina possa realmente pensar sua escolha”, menciona.

Para aquelas que se sentirem chamadas para a vida sacerdotal, o telefone da Congregação Copiosa Redenção é o (42) 9969-5647, contato da Irmã Egli, responsável pela promoção vocacional.

Ao contrário de muitos jovens, que têm dúvidas na hora de escolher um caminho a seguir, Fabiane Klein sabia ainda na adolescência a vida que queria para si: tornar-se freira. Tocada por Deus desde cedo para segui-Lo na vida religiosa, foi aos 16 anos que ela teve a certeza do chamado do Senhor. Pouco a pouco, mergulhada na espiritualidade e no amadurecimento vocacional, abraçou a sua vontade com fidelidade. Hoje, 17 anos depois, uma certeza a acompanha todos os dias: “Me sinto feliz na minha missão” (Foto: O Presente)

 

REALIZAÇÃO PESSOAL

Atualmente com 38 anos, e depois de 17 anos de trajetória de vida consagrada, dedicada a Deus, Fabiane enfatiza: “Me sinto realizada na minha missão. Sou muito feliz e livre. Encontrei a liberdade na vida religiosa”.

Como inspiração, ela destaca a figura do Papa Francisco, que, no ponto de vista dela, assim como a Congregação Copiosa Redenção, é um exemplo de acolhimento. “É um homem de Deus, muito sábio e absolutamente acolhedor. Acolhe o ser humano independente da realidade que está vivendo. Precisamos de mais homens e mulheres como ele, que saibam ter esse olhar para o próximo”, avalia. “Cabe a nós olharmos ao próximo com o mesmo amor que Deus nos acolheria”, finaliza.

 

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