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Marechal Gestantes em casa

Lei que determina afastamento de grávidas do trabalho presencial é polêmica e dá margem a discussões

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Michele Correa: “Em um primeiro momento não gostei de ter que trabalhar de casa. Agora, com o aumento dos casos, até me sinto mais tranquila em poder fazer meu trabalho remotamente” (Foto: Divulgação)

A lei sancionada no último dia 13 pelo presidente Jair Bolsonaro, que determina o afastamento de funcionárias gestantes de atividades presenciais durante a pandemia, é uma segurança tanto para a mãe quanto para o bebê, em virtude dos riscos que o acometimento pela Covid-19 pode causar.

O afastamento não causa prejuízo na remuneração das gestantes, mas estabelece que a funcionária fique à disposição do empregador para exercer as atividades em casa de maneira on-line ou outro tipo de trabalho a distância, valendo até o fim do estado de emergência em saúde pública.

A rondonense Kelly Beatriz Martins Miranda é atendente de caixa em um posto de combustíveis há um ano e cinco meses e está na trigésima semana de gravidez. Afastada do trabalho em razão da nova lei, devido à função que ocupa ela não consegue realizar o trabalho de casa. “Trabalhei praticamente minha gestação inteira. Não gostei muito de ser afastada. Preferia trabalhar até próximo ao parto”, declarou ao O Presente.

Entretanto, ela reconhece o risco que o contato com alguém infectado com o coronavírus poderia representar para ela e para o bebê. “Acredito que estava exposta ao vírus, pois meu local de trabalho é muito movimentado e eu tinha contato direto com as pessoas e com dinheiro”, expõe.
Kelly acredita que se todos seguissem à risca os cuidados básicos necessários, como o uso de máscara, a segurança seria maior e, talvez, sem necessidade de afastamento.

De acordo com a rondonense, nem todos os clientes respeitam o uso de máscara e alguns ficam irritados quando é feito o pedido para usá-la. Há, ainda, os que não acreditam que o uso da máscara ajuda a evitar a transmissão do vírus e ainda fazem piada a respeito. “Mesmo assim, seguimos todas as recomendações e exigimos o uso das máscaras”, ressalta.

Mesmo querendo continuar no trabalho, a atendente de caixa Kelly Miranda reconhece os riscos que a exposição em potencial ao vírus pode representar às gestantes. “Com um simples descuido, posso pegar e transmitir para outras pessoas, principalmente para meu filho” (Foto: Divulgação)

 

Michele Correa, colaboradora do Jornal O Presente, está no início do terceiro trimestre de gestação e levou um susto quando foi informada pelo Setor de Recursos Humanos da empresa que teria que cumprir expediente em casa, de forma remota.

Ela conta que pretendia se afastar do trabalho somente quando a gestação estivesse quase completa. “No primeiro momento não gostei muito da ideia de ter que ficar em casa, apesar de estar evitando ao máximo de sair. Pretendia trabalhar até o final da gestação ou até onde eu aguentasse”, comenta.

Conforme Michele, o fato de ficar sozinha em casa, sem o contato presencial com os colegas de trabalho, a deixa um pouco ansiosa. “Ficar sozinha, sem ter contato com nenhum colega de trabalho para ter alguns momentos de descontração acaba gerando ansiedade”, revela.

Ela diz que mesmo antes de engravidar já tomava todos os cuidados em relação a higiene das mãos, distanciamento e uso de máscaras. “Estava tomando o máximo de cuidado possível, mas é claro que sempre gera uma preocupação. Com o aumento dos casos até me sinto mais tranquila em poder ficar em casa”, expõe.

Michele Correa: “Em um primeiro momento não gostei de ter que trabalhar de casa. Agora, com o aumento dos casos, até me sinto mais tranquila em poder fazer meu trabalho remotamente” (Foto: Divulgação)

 

RISCOS À GESTANTE E AO BEBÊ

Desde o início da pandemia do coronavírus, especialistas do mundo todo acompanham os efeitos que o agente infeccioso pode representar para as grávidas.

As últimas constatações dão conta que as gestantes com Covid-19 apresentam maior risco de agravamento e necessidade de intubação quando comparadas às mulheres da mesma idade que não estavam gestantes.

Em setembro de 2020 foi publicado um estudo no British Medical Journal que indicava que gestantes infectadas com o coronavírus tinham 62% de chance a mais de precisarem de internação em unidade de terapia intensiva (UTI) e a probabilidade de necessitar de ventilação mecânica invasiva de 88%. Os dados formam reunidos com base em 11 mil grávidas com suspeita ou confirmação de Covid-19 que precisaram ser internadas por qualquer motivo. Os dados foram confrontados com os de outras mulheres da mesma faixa etária que também buscaram atendimento médico, mas não esperavam um bebê.

Dados do Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19 (OOBr Covid-19) revelam que a realidade das gestantes brasileiras durante a pandemia é bastante grave.

Em 2020, foram registradas 453 mortes pela infecção com o novo coronavírus nas mulheres que esperam ou acabaram de dar à luz a um filho, o que representa uma média semanal de 10,5 óbitos.

No primeiro quadrimestre deste ano, já foram registradas 289 mortes de gestantes pela Covid-19, o que faz a taxa semanal de óbitos nessa população dobrar.

De acordo com os números do OOBr Covid-19, o crescimento de mortes entre grávidas foi de 145,4% na comparação entre os dois anos, enquanto na população geral o aumento ficou em 61,6%.

 

DESCUMPRIMENTO DA LEI PODE GERAR MULTA AO EMPREGADO

Se por um lado a lei é importante para resguardar a saúde da mãe e do bebê, sob outra perspectiva, o afastamento da funcionária gera, em alguns casos, uma sobrecarga ao empregador.
Segundo o advogado Oscar Nasihgil, a nova lei foi elaborada de forma muito simplista, o que deixa margem a discussões sobre sua aplicabilidade. De acordo com ele, para as empresas que estão preparadas para trabalhos a distância ou que a atividade permite, o afastamento se torna mais viável para o empregador, entretanto, para as empresas que não reúnem condições para tanto, ou as atividades não predisponham trabalhos remotos, o afastamento pode se tornar um problema para a empresa. “Simplesmente haverá dispensa das atividades presenciais sem prejuízo de qualquer verba de cunho trabalhista, previdenciária ou fundiária. O ônus vem totalmente para o empregador”, destaca.

Para Nasihgil, ao determinar o afastamento da gestante das atividades presenciais, o governo tirou de sua responsabilidade o ônus e o entregou para o empregador. “Seria muito fácil na cadeia de relações o governo assumir esta situação e determinar o afastamento previdenciário da empregada gestante, o que não imputaria ao empregador a responsabilidade objetiva em face da pandemia. Quer dizer, há pandemia e a empregada está grávida, o problema passa a ser do empregador e não do Estado”, pontua.

O advogado acredita que neste ponto a lei se tornou incoerente, já que inúmeras medidas emergenciais, como a suspensão do contrato de trabalho, foram tomadas durante a pandemia visando a manutenção do emprego. “Desta vez, simplesmente se determinou o afastamento sem amparo governamental. Considerando os diversos lockdowns pelos quais os empresários já passaram, prejuízos consideráveis nas suas atividades, é mais uma regra governamental que merece crítica, pois esta responsabilidade seria do Estado e não do empregador”, opina.

 

OPÇÕES PARA O EMPREGADOR

Conforme Nasihgil, a questão é polêmica porque estão em vigência outras medidas de garantia ao emprego, como, por exemplo, a suspensão do contrato de trabalho.

Ele explica que existe um princípio maior no direito brasileiro, contido no artigo 5º inciso II da Constituição Federal, que disciplina que ninguém poderá fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, o que permitiria, já que a lei não proíbe, o empregador se utilizar de alguns mecanismos. “Como, por exemplo, teletrabalho, antecipação de férias individuais, inclusão em férias coletivas, aproveitamento e antecipação de feriados e o banco de horas, mas são situações paliativas e com decurso de tempo curto”, comenta.

Outra condição, aponta o advogado, seria a suspensão temporária do contrato de trabalho. “Poder-se-ia até caminhar neste sentido, entretanto, é apenas por 120 dias e a empregada não pode sofrer qualquer prejuízo na sua remuneração e nos demais direitos trabalhistas”, salienta.

 

DESCUMPRIMENTO DA LEI

Nasihgil alerta que o não cumprimento da lei pode acarretar ao empregador punição, com multas impostas pelo Ministério do Trabalho e/ou até mesmo consequências mais severas. “O empresário pode sofrer ações trabalhistas e inclusive mobilização do próprio Ministério Público”, explica.
Ele lembra também que, por norma trabalhista, o empregador está impedido de efetuar qualquer demissão da empregada gestante, pois ela tem estabilidade até cinco meses após o parto.

Advogado Oscar Nasihgil: “A questão é polêmica, porque estão em vigência outras medidas de garantia ao emprego, como a suspensão do contrato de trabalho” (Foto: Arquivo/OP)

 

APENAS DEZ GRÁVIDAS FORAM VACINADAS CONTRA COVID-19 EM MARECHAL RONDON

No final de abril o Ministério da Saúde inclui todas as gestantes e puérperas (mulheres no período pós-parto) no grupo prioritário de vacinação contra a Covid-19. Mas, alguns dias depois, o Ministério da Saúde voltou atrás e anunciou que a vacinação deste grupo ficaria restrita apenas às gestantes com comorbidades (doenças pré-existentes).

Recentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu o uso da vacina da AstraZeneca devido ao óbito de uma gestante de 35 anos por conta de um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVC). O óbito pode ter ligação com o uso da vacina AstraZeneca, mas ainda não foi comprovado que isso tenha causado a morte da gestante. Enquanto não se chega a uma conclusão do ocorrido, a Anvisa orientou que apenas as vacinas Coronavac e Pfizer sejam aplicadas em mulheres grávidas.

Em Marechal Cândido Rondon, atualmente, 284 gestantes fazem acompanhamento na rede pública de saúde. Dentro do grupo considerado com comorbidades, apenas dez grávidas haviam sido vacinadas até ontem (27), um número abaixo do esperado, segundo a secretaria de Saúde do município, Marciane Specht.

Na opinião dela, a baixa procura está relacionada à suspensão da vacina AstraZeneca, o que deve ter gerado receio nas gestantes. “Ao perceber o erro (que a AstraZeneca não tem a liberação do uso em grávidas), o Ministério da Saúde logo enviou aos municípios doses da Coronavac, que não tem nenhuma contraindicação”, expõe.

Além de contemplar as gestantes com comorbidades (com 18 anos ou mais), a vacinação no Parque de Exposições se estende também para pessoas com 60 anos ou mais para serem imunizadas com a primeira e a segunda dose da vacina contra a Covid-19.

Gestantes e puérperas que possuem comorbidades devem apresentar no ato da vacinação, além de documentos pessoais e carteira de vacinação, uma declaração médica que comprove tal condição.

O atendimento acontece das 08 às 13 horas, todas as segundas, quartas e sextas-feiras.

Secretária de Saúde de Marechal Rondon, Marciane Specht: “Acredito que a baixa procura está relacionada à suspensão da vacina AstraZeneca, o que deve ter gerado receio nas gestantes” (Foto: Arquivo/OP)

 

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