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Dom João Carlos Seneme

Vou agora levantar-me e retornar à casa do meu Pai

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O capítulo 15 é o coração do evangelho de São Lucas. Alguns estudiosos o definem como o “evangelho dentro do evangelho”. O Deus da justiça, graças à mediação de Moisés, se converte em Deus da misericórdia, o pai que acolhe o filho ingrato faz uma festa quando ele é encontrado. Tais atitudes colocam em crise toda presunção e convicção humana sobre o divino e, sobretudo, a imagem que muitos fazem de Deus. Deus permanece perturbador e indescritível.

Jesus relata as parábolas para defender seu modo de agir em relação aos pecadores. Ele responde aos fariseus e aos escribas que “murmuravam porque Jesus recebia os pecadores e comia com eles”. As parábolas revelam a vontade de Deus: ninguém pode ser deixado de lado. Todos podem encontrar o caminho de volta à casa. Por isso aparece no evangelho de hoje a alegria ao encontrar o que estava perdido. As parábolas revelam a dimensão do amor de Deus que vai contra o modo de pensar e agir do homem. Nenhum pastor deixa 99 ovelhas no deserto para ir atrás de uma que se perdeu; a mulher pobre não pode fazer festa com as amigas porque encontrou uma simples moeda; um pai não dá ao filho mais novo uma herança para gastar como quiser.

Jesus quer acentuar que o modo de agir de Deus não é igual ao nosso: “Meus pensamentos não são vossos pensamentos, vossos caminhos não são meus caminhos” (Is 55,8). Na sua atitude e no seu ensinamento, Jesus revela a atitude do Pai, o grande protagonista das parábolas: ele é o pastor que vai à procura até encontrar, é a mulher que varre a casa até encontrar a moeda, é o Pai cujo amor não desanima; ele aguarda todos os dias o retorno do filho.

Por isso são chamadas de parábolas da misericórdia porque elas revelam o amor gratuito e sem medidas do Pai. Em todas elas, está presente a manifestação da alegria. Deus se alegra ao encontrar o que estava perdido. Na parábola do pai bondoso, a alegria transborda e se torna festa: traje de luxo, anel no dedo, calçado, novilho gordo. “É preciso alegrar-se porque esse seu irmão estava morto e voltou à vida; estava perdido e foi encontrado”.

A atitude do irmão mais velho chama a atenção pelo coração duro, incapaz de perdoar e participar da festa. Não podemos esquecer que Jesus se dirige aos fariseus e doutores da lei. Eles são os “irmãos mais velhos” que não admitem o modo com que Jesus apresenta a imagem de Deus misericordioso e compassivo. O filho mais velho é convidado a entrar na lógica de Deus em relação aos pecadores que Jesus revela em plenitude. Quem escuta a parábola é convidado a escolher de que lado está.

Aqui Jesus questiona cada um de nós dentro de nossas comunidades. Somos capazes de reconhecer a nossa própria fraqueza e miséria, como fez o filho pródigo? Somos capazes de correr ao encontro de um irmão perdido, como fez o pai? Ou somos como o irmão mais velho, que segue as regras, tem medo do Pai e é incapaz de ter um coração misericordioso, de se alegrar com a volta do irmão que errou?

Esta é a mensagem de Jesus para nós hoje. Deus não age como um rei, senhor ou juiz. Jesus o experimenta como um pai incrivelmente bom, que respeita as escolhas de seus filhos, mesmo que sejam erradas. Ele sempre espera pacientemente o retorno e acolhe com um abraço carinhoso e restaurador. Deste encontro nasceram verdadeiras conversões que modificaram a história da humanidade.

Por Dom João Carlos Seneme. Ele é bispo da Diocese de Toledo

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