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O trabalho pedagógico como ferramenta de prevenção contra a violência doméstica previsto pela Lei Maria da Penha

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Pesquisas recentes evidenciam um crescente aumento do número de casos de feminicídio no cenário brasileiro (Fórum Brasileiro  de Segurança Pública – FBSP), sendo que o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial de países com maior índice de violência contra mulheres (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos – ACNUDH). Esse aumento pode ter ocorrido por diversos fatores, dentre eles a pandemia de Covid-19, visto que o isolamento social obrigou muitas mulheres a ficarem confinadas com seus agressores. Além disso, outro fator a ser considerado para esse aumento exponencial de casos está  relacionado ao aumento do desemprego, tendo em vista que muitas mulheres perderam sua autonomia financeira e passaram a depender de seus companheiros agressores, sendo mais uma dificuldade para romper o ciclo de violência, conforme pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, publicada no ano de 2019.

Que a violência doméstica possui dados preocupantes no Brasil não é novidade, no entanto, não podemos naturalizar esse tipo de violência e não nos alarmarmos com tal questão. Portanto, não devemos estar negligentes em relação ao seu questionamento, já que, apesar do pleno funcionamento da Lei Maria da Penha (11.304/2006) e da Lei do Feminicídio (13.104/2015), o número de assassinatos de mulheres por razões de gênero, por exemplo, continua crescendo.

Considerando esses aspectos, destaca-se que, para além das medidas punitivas aos atores de violência, é necessário que se leve em consideração o trabalho de prevenção e conscientização acerca desse tipo de violência por meio de medidas preventivas e educativas. Tais medidas são extremamente necessárias para o combate à violência contra as mulheres, uma vez que devem educar os indivíduos sobre a desigualdade de gênero e sobre comportamentos violentos, já que essas condutas não são compatíveis com a sociedade civil e com os direitos humanos e das mulheres.

Visando alcançar tal objetivo, a própria Lei Maria da Penha prevê que:

 

Art. 8º A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto  articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes: I – a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação; II – a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às consequências e à frequência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;

[…]
Art. 35. A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências:  (vide Lei nº 14.316, de 2022)

[…]
IV – programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar;

V – centros de educação e de reabilitação para os agressores. (BRASIL, 2006)

 

Como a própria lei supracitada afirma, cabe ao Estado, em parceria com a União, Distrito Federal e Municípios, promover uma articulação de diversas medidas que visem coibir, educar e conscientizar a população acerca da violência doméstica. Com isso, não basta apenas punir os autores de violência, mas também educar a sociedade sobre temas que fomentam a violência doméstica.

Para além da lei Maria da Penha, em diversos documentos encontram-se presentes propostas que incluem medidas educativas auxiliadoras no enfrentamento à violência contra as mulheres. Dentre esses documentos, pode-se citar o “Pacto Nacional de
Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres”, o qual abrange medidas multidisciplinares de atuação no enfrentamento dessa forma de violência, conforme demonstrado abaixo:

O Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres parte do entendimento de que a violência constitui um fenômeno de caráter multidimensional, que requer a implementação de políticas públicas amplas e articuladas nas mais
diferentes esferas da vida social, como na educação, no mundo do trabalho, na saúde, na segurança pública, na assistência social, na justiça, na assistência social, entre outras[…] ( BRASIL,2010, p. 04)

Exemplos de medidas educativas são palestras, folhetos, oficinas, campanhas e demais atividades que visem falar não apenas  sobre a violência, mas também sobre suas possíveis causas, como a desigualdade de gênero. Todas essas atividades devem atingir os mais diversos lugares da sociedade: Escolas, Unidades Básicas de Saúde – UBS, Unidades de Pronto Atendimento – UPA, delegacias e outros. Ademais, todos os profissionais devem estar preparados adequadamente para atender as mulheres que chegam até esses locais em busca de ajuda ou acolhimento, visando fornecer um atendimento humanizado e, assim, impedir que ocorra a revitimização de tais mulheres ou qualquer outro tipo de trauma.

Todas essas práticas devem primar por, primeiramente, conscientizar a população acerca do que é propriamente a violência  contra mulheres, bem como instruir sobre o que está previsto pela lei Maria da Penha. Assim, deve-se lembrar que a violência  contra as mulheres não fica restrita aos ambientes domésticos, a violência contra as mulheres está presente em todos as esferas da sociedade e em todos os locais, seja nas escolas, universidades, nas ruas e até mesmo dentro das igrejas.

Dessa forma, não basta apenas criar medidas jurídicas para punir os atos de violência contra as mulheres, é necessário um intenso trabalho educacional para compreender as desigualdades de gênero e buscar alternativas viáveis para conseguir reverter práticas machistas e desiguais que ainda predominam na sociedade. Portanto, o caminho a ser percorrido é pela educação, mas não apenas nos espaços de educação  formal como escolas e universidades, é preciso adentrar nos mais diversos espaços e grupos presentes na sociedade.

Nesse sentido, Carlos Rodrigues Brandão explica:

 

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação […](BRANDÃO, 2007.p. 7).

 

Como dito na citação acima, não existe nenhum espaço onde a educação não esteja presente e, por isso, a possibilidade de as atividades pedagógicas acerca dos temas supracitados ser feita nesses espaços é de vital importância para que o combate à violência contra as mulheres seja efetivo. Não existe possibilidade de combater uma doença sem diagnosticar de onde ela surge, assim também é com a violência contra as mulheres. As medidas jurídicas previstas em lei não darão conta de toda a demanda presente na sociedade para tratar as causas de todos esses casos de violência estarem acontecendo, é necessário um amplo debate dentro da sociedade civil quanto a desigualdade de gênero, de modo que o conceito seja tratado de forma objetiva, a fim de que facilite a compreensão de todos.

Seja para combater a violência doméstica dentro da perspectiva de uma sociedade desigual, ou para conscientizar as mulheres acerca de seus direitos e onde elas podem procurar ajuda em casos de violência, as práticas pedagógicas de toda forma precisam estar presentes para que a sociedade tenha consciência acerca de tais temas e, consequentemente, mude seu comportamento.

 

Autores:

Nathielly Lunardi Bongiorno, bolsista do Núcleo Maria da Penha (Numape)

 

Aline Fátima Rachow, bolsista do Núcleo Maria da Penha (Numape)

 

Débora Schmidt, bolsista do Núcleo Maria da Penha (Numape)

 

Nara Jank Osório Ávila, pedagoga do Núcleo Maria da Penha (Numape)

 

QUEM SOMOS

O Numape é um projeto de extensão da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Marechal Cândido Rondon. Faz parte da Superintendência Geral da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti), do Governo do Estado do Paraná.

O Numape promove o acolhimento jurídico de forma gratuita e sigilosa, assegurando a tutela de seus direitos e a desvinculação do agressor para mulheres em situação de violência doméstica dos municípios de Marechal Cândido Rondon, Quatro Pontes, Pato Bragado, Entre Rios do Oeste, Nova Santa Rosa e Mercedes.

Em pouco mais de dois anos de atuação, o Numape realizou centenas de atendimentos jurídicos. O atendimento é realizado com uma escuta atenciosa e qualificada e todas as orientações cabíveis para cada caso são repassadas, sempre preservando a autonomia de decisão da mulher para dar seguimento nas fases processuais, que se desdobram geralmente em medidas protetivas de urgência, divórcio, dissolução de união estável, pensão e guarda dos/as filhos/as, entre outras ações. Além disso, promoveu dezenas de ações socioeducativas na comunidade em geral, alcançando inúmeras pessoas de diferentes faixas etárias e grupos sociais.

Entre em contato para saber mais sobre o serviço. O atendimento pode ser realizado pelo telefone celular e WhatsApp: (45) 99841-0892. Nos encontre também nas redes sociais. Estamos aqui por você. Até a próxima coluna!

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