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Pitoco Crematório é do prefeito

Demanda de falecidos notáveis ressuscita debate sobre ausência de um crematório em Cascavel

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“Mercado” do pó cinza pode ser tão arriscado quanto o do pó branco

Abril de 2023 – Após o velório do ex-prefeito Jacy Scanagatta, o corpo foi deslocado até Francisco Beltrão, por coincidência, através da rodovia Arnaldo Busato, nome de batismo da 163. Busato foi o melhor amigo de Jacy, definido pelo próprio como “irmão”.

Maio de 2023 – O mesmo percurso foi percorrido para a cremação do bioquímico Alvaro Largura, falecido no último domingo (21). Ida e volta pela 163 ainda inconclusa e sempre perigosa, seis horas de viagem.

Como velório é lugar para muitas coisas, inclusive para velar, e ambos (Scanagatta e Largura) reuniram muita gente influente de Cascavel, a ausência de um crematório na Capital do Oeste voltou à pauta.

A obra saiu do limbo em que estava enterrada faz décadas. O crematório de Cascavel já tem nome e endereço, com perspectiva de inauguração no próximo mês, após sucessivos
adiamentos. Será – caso se obtenha todas as licenças – anexo ao Jardins Cemitério-Parque, campo santo administrado pela empresária Celinha Mascarello.

Como Francisco Beltrão tem o know-how do negócio, é de lá que virão os empreendedores: a família Fontana, cujo patriarca é o atual jovem prefeito da cidade, Cleber. A parceria entre os Fontana e Celinha foi firmada no ano passado. Os sudoestinos atuam no setor funerário há três décadas. E devem ter feito todas as contas antes de investir aqui algo acima de R$ 6 milhões.

Haverá clientela? Quanta gente ao pó pretende voltar? Os milhões dos Fontana podem ter o mesmo destino dos cremados? O empresário cascavelense José Carlos Cintra, que também ganha a vida com a morte (tanatopraxia), pôs tudo na ponta do lápis. Ele chegou a cogitar instalar aqui um crematório.

“Calculo que o crematório de Beltrão atenda cerca de dez clientes por mês, mesmo com uma região grande, que inclui Cascavel, é pouco”, diz Zé Carlos.

Segundo ele, um dos principais custos vem do gás que aquece a câmara de cremação a até 1.800 graus. O “forno” fica ligado mais de duas horas para um adulto de tamanho médio.

“Isso vai consumir entre 60 e 70 quilos de gás. Depois desliga-se para começar do zero, do frio, com alto consumo de arranque novamente. Será difícil competir com Curitiba, cujos fornos estão acionados o tempo todo pela alta demanda da região, otimizando o uso do gás. Lá eles podem fazer cremação por pouco mais de R$ 1 mil”, opina o homem da Tanato.

O campo santo de Celinha que irá receber o primeiro crematório de Cascavel; no detalhe, o empreendedor e prefeito de Francisco Beltrão, Cleber Fontana

O valor médio de uma cremação em Beltrão fica próximo de R$ 6 mil. “Por R$ 2 mil a funerária leva o corpo até Curitiba”, diz Zé Carlos.

Embora haja coerência nos números do Zé, também é preciso considerar que morre muita gente por aqui. Somente a Acesc, de Cascavel, sepultou nada menos que 3.601 “viventes” no ano passado.

Como os terrenos dos cemitérios estão pela hora da morte (no Central não há mais disponibilidade, salvo que se adquira de terceiros por algo como R$ 30 mil – o metro quadrado mais caro da cidade), o jeito é pagar R$ 4 mil no terreno do Cristo Redentor (Guarujá). Somam-se aí outras depesas funerárias, como a urna, e já temos o custo de R$ 6 mil do crematório.

Padre Zico abençoou

O empresário Belgio Jr., que já atuou em segmento altamente combustível (posto Central Shell), também cogita estabelecer um crematório na região do Aeroporto de Cascavel. Segundo ele, seria preciso morrer com R$ 7 milhões para dar vida ao negócio do pó cinza.

Ele está com a papelada encaminhada, aguardando licenças ambientais, mas sem pressa. “Quebraram-se paradigmas e tabus nesta área, acredito que seja um bom investimento para o futuro”, disse Belgio. Os tais paradigmas aos quais se refere são as resistências que algumas setores religiosos ainda nutrem com a cremação.

Vivíssimo do ponto de vista de financiamento da Igreja, o então padre Zico, quando no comando da paróquia do bairro Cancelli, três anos atrás, pôs à venda 552 jazigos do único cinerário da região. Fica sob a belíssima nave central do templo em fase final de reforma. Cinerários são compostos de urnas para guardar as cinzas dos que ao pó voltaram.

Cada jazigo custa R$ 4 mil e uma anuidade de manutenção. Zico, hoje bispo auxiliar de Curitiba, nem precisou buscar uma brecha na lei bíblica para justificar negócios na área do pó. “A prática da cremação é permitida pelo Vaticano desde 1963, e em 2016, foram definidas regras para este processo”, explicou Zico.

Em tempo: em uma busca rápida na internet, percebe-se que quase 15 anos atrás, em agosto de 2009, o então vereador Gilmar Gaitkoski apresentava uma indicação para construção de um crematório em Cascavel. “A falta de espaço urbano para a expansão dos cemitérios tem trazido grandes problemas para os administradores públicos”, argumentava o edil na época.

Vários prefeitos se sucederam de lá até aqui. E pelo jeito, precisou vir um prefeito de outra região para resolver o impasse. Caberá ao prefeito de Francisco Beltrão mostrar que o negócio do pó cinza pode não ser tão lucrativo quanto o negócio do pó branco, mas que pode ser perfeitamente viável na cidade em que “sobem” 3,6 mil pessoas por ano – a maioria delas, contra a vontade.

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Pendurei a camisa do Barça

Recordo-me que eram muito caras. Mas comprei duas, uma minha, outra do meu caçula. As camisetas laranja do Barcelona foram adquiridas pela internet em 2014. Preciso reconhecer que são duráveis, uso até hoje nas peladas das quartas-feiras com os jornaleiros do Pitoco.

Usava. A última vez que verguei a camiseta catalã foi na semana passada, dia 17 de maio. Decidi pendurar a camiseta do Barcelona, equipe filiada à Real Federação Espanhola de Futebol, instituição abertamente (por ação e omissão) racista.

Sei que minha decisão não implicará em nenhum centavo a menos na conta da Real Federação e de nenhum torcedor a menos pagando assinatura de canal esportivo que transmita o Campeonato Espanhol. Pendurá-la também não afetará a cotação do dólar.

É apenas meu protesto silencioso, pacífico, individual. Repete aquele tiozinho que salvava uma tartaruguinha da boca de um predador quando alguém lhe disse: que diferença faz, outras milhares perecerão! “Para essa aqui, fez toda a diferença”, rebateu o misericordioso.

Pequenos gestos replicados por muitos indivíduos podem gerar grandes mudanças. Ou pode apenas parecer ridículo, insuficiente, utópico. Respeito ambas as leituras. Eu vi falta dura no Vini e na civilização, e escolhi pendurar a camiseta.

Vini Jr. mostra ao árbitro gesto do torcedor na partida em que outra vez foi vítima de racismo: não precisa ser negro para lutar contra o racismo, só precisa ser humano

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Acabou a era petit-pavé!

BobCat tratorou o último reduto das “pedras portuguesas”; Catedral ambiciona produzir estacionamento subterrâneo no local

Produzir mosaicos a partir de pedras claras mescladas com escuras em ruas e calçadas é algo que vem lá do Império Romano. Desenhos assim com petit-pavé, ou pedras portuguesas, fizeram sucesso em Copabacana e na Capital Curitiba já no distante 1920.
Em Cascavel o petit-pavé chegou nos anos 1980, na administração do prefeito Fidelcino Tolentino. A ideia era aparentemente ótima do ponto de vista estético, mas sempre foi controversa. Desde a madame de salto alto até quem via incompatibilidade com a terra vermelha, foram muitos os críticos.

Vale lembrar que antes das pedrinhas – na hipótese que houvesse calçada – era uma colcha de retalhos desuniforme, incluindo o piso barato e bruto, esteticamente pobre. Por esse ângulo, Fidel trouxe um avanço no quesito acessibilidade. Com as reformas que “mataram a cobra” no Calçadão, as pedras brancas (encardidas) deram lugar ao paver ambientalmente correto por absorver a água da chuva.

BOB-CAT NA PEDRA

O último grande reduto petit-pavé foi tratorado essa semana na frente da Catedral, cartão postal do município de Cascavel. Sai a pedra portuguesa, entram lajotas de um paver drenante mais resistente às pisadas dos milhares de pneus que estacionam no local.

Segundo o padre Divo, pároco da Catedral, as obras vão durar 45 dias e irão encurtar o espaço. “Cheguem mais cedo”, avisa ele aos rezantes. A última reforma no local, segundo o sacerdote, aconteceu em 1987. “Temos planos de edificar ali um estacionamento subterrâneo, mas é algo caro, para o futuro”, adiantou.

Quem sabe, ao “enterrar” os donos da cidade (os carros) teremos espaço na Praça da Catedral para um belo jardim de contemplação no coração de Cascavel? Deus queira…

Em tempo: atire a primeira pedra de petit-pavé quem – de bom gosto estético – nunca se incomodou com o deserto em frente ao cartão postal da cidade.

Pedrinhas controversas removidas e o novo piso drenante em frente ao cartão postal da cidade. O deserto se perpetua, mas há esperança no futuro: “enterrar” os veículos

Por Jairo Eduardo. Ele é jornalista, editor do Pitoco e assina essa coluna semanalmente no Jornal O Presente

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