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Política Entrevista ao O Presente

Advogado rondonense fala sobre as principais mudanças da nova Lei de Licitações; confira

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Advogado João Gustavo Bersch: “Nesta transição o município pode optar se deseja fazer a licitação pela nova lei ou se vai manter a lei antiga em vigência. Inclusive o Poder Público pode alternar entre as duas leis. Esse período de transição vem para facilitar a adaptação à nova legislação” (Foto: Maria Cristina Kunzler/OP)

A nova Lei de Licitações (14.133/2021), sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no último dia 1º, surge para aperfeiçoar as contratações do Poder Público e substituir a antiga legislação, que está em vigor desde 1993, portanto há 28 anos.

Embora o Congresso Nacional ainda precise votar alguns vetos do presidente, a essência do texto não muda com relação àquilo que já tinha sido aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

Os efeitos práticos da nova legislação vão se estender pelo período de dois anos, prazo estipulado para que o Poder Público e as próprias empresas possam se adaptar às novidades. “Nesta transição o município pode optar se deseja fazer a licitação pela nova lei ou se vai manter a lei antiga em vigência. Inclusive o Poder Público pode alternar entre as duas leis. Esse período de transição que o governo federal deixou expresso em um dos artigos vem para facilitar para que não apenas o Poder Público, mas as empresas também possam gradativamente se adaptar à nova legislação”, detalha o advogado rondonense João Gustavo Bersch, especialista em Direito Administrativo e Administração Pública.

Para isso, o Poder Público precisará deixar expresso no edital qual lei está sendo utilizada naquele certame, se a antiga – 8.666/93 – ou a atual, 14.133/21. “Desta forma, quem participar da licitação vai saber qual é a regra”, acrescenta.

Conforme o profissional, a lei de 1993 é subjetiva e deixava aberta a interpretações. “A nova lei tem 252 artigos e traz de forma discriminada como os procedimentos devem funcionar, preenchendo algumas lacunas de dúvidas que, por mais que a lei antiga tem praticamente 30 anos, ainda havia discussão se o procedimento poderia ser feito de um jeito ou de outro, como deveria ser feita a justificativa de alguma dispensa de licitação. Essa lei procurou trazer um pouco mais de especificação de alguns pontos. Inclusive, reiteradamente, a lei atribui a necessidade de o Poder Executivo regulamentar algumas atividades. Vários pontos terão que ser trazidos para regulamentar algumas situações de forma de contratações e licitações”, frisa.

 

TIPOS DE CONTRATAÇÃO

A lei antiga previa as seguintes formas de contratação por parte do Poder Público: concorrência, tomada de preço, pregão, convite, leilão e concurso. A nova legislação excluiu a tomada de preço e o convite, e incluiu o chamado diálogo competitivo.

“Essa nova lei englobou várias leis esparsas que foram criadas durante o tempo para servir de amparo para a nova Lei de Licitações. A lei 8.666/93, a Lei do Pregão e o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) foram englobados em uma grande lei, que é essa nova, que alguns chamam de código de contratação do Poder Público”, declara o especialista.

 

FIM DO CONVITE E DA TOMADA DE PREÇO

A modalidade chamada convite já vinha conceitualmente caindo em desuso, pois gerava dúvida sobre eventual direcionamento da licitação, lembra Bersch. “Vamos lembrar que a lei é de 1993. Para fazer a licitação antigamente era um formato, mas hoje, com a internet e a facilidade de comunicação, se tornou mais fácil encontrar licitantes, o que não acontecia no passado. Antigamente, eram enviados convites para três empresas participarem. Infelizmente, gestores públicos foram conduzindo para um formato de que havia vícios nestes convites, pois direcionavam a participantes que tinham algum tipo de vínculo, causando prejuízo, porque a proposta nem sempre era a mais vantajosa e acabavam pagando um preço mais alto, às vezes, inclusive, por um produto de menor qualidade. O convite foi caindo em desuso, tanto que na região são poucos os municípios que ainda utilizam esse procedimento”, detalha.

Na tomada de preço, por sua vez, a forma de contratação variava de acordo com o valor. Agora, será de acordo com o objeto. “A concorrência e tomada de preço só mudavam porque eram decorrentes de valores diferentes. Na nova lei, os dois procedimentos foram unificados e foi mantida apenas a concorrência. Digamos que a tomada de preço foi englobada pela concorrência”, expõe o rondonense.

 

PREGÃO

Em 2012, foi sancionada a Lei do Pregão (10.520), que ganhou grande adesão. A estimativa é de que em torno de 80% das licitações do Poder Público são feitas através desta modalidade, principalmente pelo sistema de registro de preço, quando se trata de aquisição de bens. “Essa forma de contratação ganhou espaço e o convite ficou em desuso. O pregão vai ser a grande licitação do Poder Público. A grande maioria das empresas já participa neste sistema”, cita Bersch.

 

 

DIÁLOGO COMPETITIVO

O diálogo competitivo, por sua vez, é uma nova modalidade de contratação. “Surgiu de uma forma análoga à iniciativa privada, que tem usado em grandes contratações. Serve para trazer os licitantes para uma conversa para exposição do projeto. Os licitantes têm condições de prestar sua opinião e dar sugestões sobre como pode ser feito o projeto. A partir do momento que o Poder Público conta com essas informações, que são técnicas, faz a licitação de diálogo competitivo”, explica o rondonense.

 

PRAZOS

Os prazos passam a contar em dias úteis, e não mais em dias corridos. A mudança é uma adaptação ao Código de Processo Civil.

 

PARECER JURÍDICO

Outra novidade é a regulamentação da atividade do parecerista jurídico. “Muitos prefeitos e servidores tinham problemas, inclusive judiciais, porque amparavam suas decisões no parecer jurídico. Só que este parecer jurídico, dentro da Lei de Licitações, não tinha qualquer tipo de previsão sobre como deveria ser. A nova lei traz em que momento o parecer jurídico terá que ser dado e como deve ser elaborado. Isso dá segurança para os gestores”, argumenta o advogado, que emenda: “Houve prefeitos que responderam processo por suposto ato de improbidade mesmo tendo parecer jurídico dizendo que ele poderia ter feito aquele ato. Agora, essa vinculação um pouco maior do parecer jurídico traz segurança”.

 

Especialista em Direito Administrativo e Administração Pública, advogado rondonense João Gustavo Bersch: “A nova lei tem 252 artigos e traz de forma discriminada como os procedimentos devem funcionar, preenchendo algumas lacunas de dúvidas que, por mais que a lei antiga tem praticamente 30 anos, ainda havia discussão” (Foto: Maria Cristina Kunzler/OP)

 

PRAZO DE CONTRATO

O prazo de contrato foi ampliado de cinco para dez anos. “O contrato pode ser prorrogado, desde que previsto em edital, em até dez anos”, frisa.

 

DISPENSA DE LICITAÇÃO

Na antiga lei, a dispensa de licitação por situação de emergência ou de calamidade pública tinha como prazo 180 dias. A nova legislação amplia para um ano. “É uma novidade, pois dá um prazo maior para que não seja necessário renovar o ato de estado de calamidade ou renovar o contrato. Podemos pegar o exemplo da atual pandemia”, compara Bersch.

 

LIMITE DA DISPENSA DE LICITAÇÃO

A lei 8.666/93 previa que a dispensa de licitação seria de 10% do valor do convite. Este valor foi atualizado em 2018 para R$ 176 mil, o que significa que era de R$ 17,6 mil no ano e por objeto de contratação. Agora, foi reajustado para R$ 50 mil. “Não faz mais uma ligação com o valor de convite, até porque não há mais convite. Até 2018, quando na gestão do ex-presidente Michel Temer foi alterado o valor, os gestores só poderiam fazer dispensa de R$ 8 mil ao ano, por objeto. Era um valor que deixava muito engessada a administração pública. Com a atualização de 2018, mudou para R$ 17,6 mil e agora chegou em um valor considerado ideal para as grandes cidades. Para cidades de pequeno porte é bastante vultuoso para dispensa de licitação, pensando que isso serve para serviço e aquisição de bens. Mas, em contrapartida, a nova legislação trouxe bem mais exigências na fase preparatória da licitação”, avalia.

 

FASE PREPARATÓRIA DA LICITAÇÃO

Quando o Poder Público decidir comprar um bem ou contratar um serviço, precisará de forma fundamentada explicar itens como: por que quer comprar, qual a necessidade, se tem orçamento, qual o orçamento, por qual razão não está fazendo um processo licitatório especificamente, bem como precisa justificar o preço e as análises de risco da contratação.

“De certa forma, há quem diga que internamente burocratizou um pouco mais o Poder Público, mas é uma burocracia, na minha visão, necessária. A lei 8.666 dizia que poderia ser feita a dispensa através de procedimento prévio. Porém, o que era esse procedimento prévio? Isso foi se construindo pela doutrina e pela jurisprudência, pois a lei não dizia. Muitos políticos eram absolvidos em processos porque comprovavam minimamente um procedimento prévio, e muitos eram condenados porque alguns juízes entendiam que esse procedimento prévio não era o que a lei dizia. Agora a lei veio trazer de forma esmiuçada o que quer como procedimento prévio. Isso está bem descrito”, analisa o advogado.

 

PLANEJAMENTO ANUAL

A lei 14.133/2021 prevê, ainda, a exigência de um planejamento anual de contratações do Poder Público. “Se no ano passado houve a contratação de mil resmas de papel A4, o município precisará prever essas mil resmas neste ano, ou explicar por que está aumentando ou diminuindo a quantia. Esse planejamento anual precisa ser cumprido e precisa ser real”, observa.

 

GARANTIAS DAS EMPRESAS

Para as empresas, o edital e as exigências para participarem das contratações com o Poder Público mudam pouco, comenta Bersch.

Porém, algumas formas de contratação exigirão algumas garantias, que até então eram facultativas. “Há um dispositivo específico na nova lei sobre garantias. O Poder Público vai poder exigir, por exemplo, em uma grande obra, a contratação de um seguro. Se a empresa não cumprir ou não vier a assinar o contrato, não apresentar um documento específico, esse seguro pode ser acionado”, adianta.

 

PROPOSTAS E LANCES

Mais um ponto que a nova lei trouxe como novidade envolve a apresentação das propostas e dos lances. “A lei antiga permitia apenas ao pregão utilizar este procedimento. A empresa se habilitava e, primeiramente, entregava o envelope com a proposta de preço. Então ia para a sessão dos lances e após o fim desta sessão era aberto o envelope de habilitação documental. A concorrência também passa a ser assim. Unificou-se esse entendimento”, diz o especialista em Administração Pública.

Diante disso, com a nova lei tanto no pregão como na concorrência as empresas apresentarão a habilitação prévia e partirão para os lances das propostas. “Somente após isso serão abertos os envelopes com habilitação jurídica e avaliação da documentação”, explica.

 

CRIMES E PENAS

A lei 8.666/93 tinha em seu texto a previsão dos crimes e penas. Na legislação sancionada neste mês houve essa exclusão, pois já tinham sido inseridos no Código Penal por meio do artigo 337 e seguintes. “Desta forma, houve aumento de pena de alguns crimes, em especial o crime por dispensa indevida de licitação. Anteriormente era de três a cinco anos e agora passa a ser de quatro a oito anos. O agente público vai responder ao processo penal na íntegra. As sanções foram agravadas e outros dispositivos também tiveram uma elevação de pena, trazendo mais severidade à normativa penal dos crimes de licitação”, alerta o advogado.

 

PORTAL NACIONAL DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS

A nova Lei de Licitações, por fim, contempla a criação de um portal nacional para ser instrumento visando englobar todos os órgãos públicos do país, seja da União, Estados ou municípios. “Será criada uma referência nacional de contratações públicas. Quando os municípios, Estados e União forem se amparar em valores para contratação, vão se amparar nesse portal nacional. As empresas licitantes também poderão utilizar o portal, que será público. Vai ser uma grande ferramenta de controle público e suporte, pois no portal constarão as empresas aptas e inaptas em contratar com o Poder Público, algo que hoje é difícil em constatar”, conclui João Bersch.

 

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