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Elio Migliorança

Moinhos de vento

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O espanhol Miguel de Cervantes escreveu o livro Dom Quixote de La Mancha por volta do ano de 1.550, 50 anos depois do descobrimento do Brasil. Publicado em 1605, conta a história de um louco cavaleiro que investe sua lança contra as imensas pás rodantes de um moinho de vento, tendo como testemunha o atônito e fiel escudeiro Sancho Pança, que tentou em vão demovê-lo da ideia.

Dom Quixote enlouquecera lendo livros de ficção e acreditando serem verdadeiras as histórias que lia. Resolveu tornar-se cavaleiro e sua primeira batalha foi contra as pás dos moinhos de vento que ele acreditou serem monstros que deveria matar. Quebrou a cara e seguiu seu destino lutando a boa guerra contra as injustiças do seu louco mundo imaginário.

As duas últimas semanas tiveram o poder de fazer-me sentir semelhante ao Dom Quixote. Parece que estamos lutando contra os “moinhos de vento” quando tentamos entender a política do governo com relação aos combustíveis. A década de 1950 ficou marcada pela campanha do “Petróleo é nosso”. A década de 1980 ficou marcada pelo “choque do petróleo”, quando os árabes assustaram o mundo com os aumentos brutais nos preços dos combustíveis, dos quais eles praticamente detinham toda a produção mundial. E a década de 1990 ficou marcada pelo esforço dos brasileiros na prospecção, extração e refino do petróleo em território nacional, o que nos permitiu a autossuficiência em produção.

A Petrobras é uma gigante mundial dos combustíveis, uma das mais lucrativas do mundo. Parte dela foi vendida, mas o governo ainda é o maior acionista. A economia brasileira é hoje refém dos combustíveis e da energia elétrica, por coincidência dois insumos estratégicos que estão nas mãos do governo. Tanto a Petrobras quanto as empresas elétricas pertencem ao governo.

Recentemente, o presidente da República demitiu o presidente da Petrobras colocando no seu lugar o general Silva e Luna, justamente com a promessa de que o povo brasileiro não seria mais surpreendido com aumentos na calada da noite. Não é o que está acontecendo, e, pior, numa economia em crise como é o nosso caso, os combustíveis sobem a patamares incompreensíveis.

Só no ano de 2021 o óleo diesel já subiu 65,3% e a gasolina 73,4%. O salário de ninguém foi reajustado com esta porcentagem, a não ser o do general Silva e Luna, que, segundo divulgado recentemente, tem um salário de R$ 260 mil mensais.

Sabendo que o governo é o dono da Petrobras porque possui mais do que 50% do capital da empresa, e considerando que os sucessivos aumentos dos combustíveis têm revoltado todos os brasileiros, o cidadão comum não consegue entender como os preços não acompanham a realidade nacional e têm que ficar atrelados à variação do dólar.

Somos autossuficientes, isto é, produzimos o que consumimos, mas temos que pagar o valor que os americanos pagam, com a diferença que a média salarial deles é 11 vezes maior do que a brasileira.

E como não conseguimos decifrar esta política que enriquece alguns e empobrece a maioria, realmente parece que somos iguais a Dom Quixote e estamos lutando contra um monstro parecido com os “moinhos de vento”: forte, tenebroso, invencível e que aos poucos vai engolindo o salário de todos.

Quem sabe um iluminado consegue me fazer entender este mistério.

 

O autor é empresário rural, professor aposentado e ex-prefeito de Nova Santa Rosa

miglioranza@opcaonet.com.br

 

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