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Elio Migliorança

Eu e os haitianos

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Não tenho nada e ao mesmo tempo tudo a ver com os haitianos. O que sabemos do Haiti é quase nada e o que ouço na rua é a opinião de gente que, mesmo não sabendo quase nada, sabe criticar e abominar a presença dos haitianos no Brasil.

E tudo isso assumiu uma proporção além da imaginação depois que um infausto acontecimento provocou uma explosão de dimensões absurdas, na vizinha e progressista cidade de Palotina, explosão similar a uma bomba russa lançada em território ucraniano.

Positivos foram a pronta atuação do Corpo de Bombeiros e o empenho dos responsáveis pela cooperativa em atender prontamente os feridos e dar todo o apoio às famílias que perderam seus entes queridos naquele trágico e imprevisível acontecimento.

Inusitado é que nem um de nós mortais comuns sabia que pó de milho serve para fazer bombas explosivas. A explosão, segundo dizem, foi provocada por uma fagulha em contato com o pó oriundo da limpeza do inocente milho que colhemos nas lavouras, e que nós acreditávamos servia apenas para encher o papo dos franguinhos.

Quem em sã consciência imaginou um dia ver uma cena dessas, uma explosão com tais dimensões destrutivas?

A conclusão é que em cada cooperativa e cerealista da região existe uma bomba engatilhada no subsolo. Certo é que este povo sofrido deixou seu país depois de um terremoto que ceifou milhares de vida e destruiu para muitos a perspectiva de futuro em seu país. Tiveram que migrar para outras terras para buscar uma oportunidade de construir o futuro de suas famílias. Em terra estrangeira e sem conhecer a língua, aceitaram qualquer oportunidade de trabalho para sobreviver e retomar a vida perdida em seu país de origem.

Temos milhões de brasileiros também em situação de pobreza extrema, mas isso não justifica tratarmos com discriminação aqueles que chegaram em busca da sobrevivência. Um detalhe que para muitos passou despercebido, mas que foi notado pelas pessoas com maior sensibilidade e consideração foi a forma como alguns meios de comunicação noticiaram o fato ao longo dos dois dias em que o assunto virou manchete nacional. Ao noticiarem o número de mortos. Falavam de fulano de tal e mais oito haitianos, parecendo que estes não tinham nome nem sobrenome.

Agora, com mais informações sobre a tragédia e suas vítimas, sabemos que vários estavam aqui sozinhos, pois sua família está no Haiti e eles enviavam a maior parte do salário para a família. Algumas são famílias numerosas e agora fica um enorme ponto de interrogação sobre o futuro delas. Em casos assim é muito sensato fazermos o exercício da empatia, ou seja, colocar-se no lugar deles, imaginando que nós fôssemos os imigrantes, tendo ido trabalhar em outro país e fôssemos as vítimas de uma tragédia semelhante. É no mínimo uma questão de humanidade que todos tenham nome, sobrenome e a solidariedade dos demais quando uma tragédia se abate sobre sua cabeça.

E como os mortos não podem ressuscitar, é preciso que haja pessoas de bom coração para amparar, consolar e colaborar para que estas famílias encontrem um novo caminho para continuar a viver. E que todos tratem os estrangeiros com dignidade e respeito, afinal assim gostaríamos de ser tratados se em outro país estivéssemos para ganhar o sustento da família.

Por Elio Migliorança. Ele é empresário rural, professor aposentado e ex-prefeito de Nova Santa Rosa

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