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Elio Migliorança

Onde está a gravidade?

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A semana começou com os brasileiros atentos a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), já que nos últimos anos a judicialização de tudo no Brasil tem sido prática comum.

O maior crítico da judicialização de tudo é o Congresso Nacional, mas são os próprios partidos políticos aqueles que mais recorrem ao STF em busca de suas barganhas políticas, como esta ação apresentada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

Como a ação foi derrotada, a pergunta que fica é: existe alguma gravidade numa ação deste tipo? Existe, sim.

Primeiro é uma ruinosa politização do Poder Judiciário, o que não é bom para ninguém e muito menos para o equilíbrio entre os poderes da República.

Segundo, e mais grave fator, é o fato do STF aceitar discutir e perder tempo com uma ação destas que sequer deveria ter sido aceita para votação, já que o § 4º do artigo 57 diz o seguinte: “Cada uma das Casas (Senado e Câmara) reunir-se-á em sessões preparatórias… vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.

Mais grave ainda do que a aceitação da ação para a votação foram os votos de cinco ministros a favor da esdrúxula proposta, em flagrante desrespeito à Constituição, prova da decomposição ética do STF. Logo eles, que são os responsáveis pelo respeito e cumprimento à Constituição, e são muito bem pagos para tal.

Foi patético o voto “sim e não” do recém-empossado Kassio Marques, indicado pelo presidente Bolsonaro, que, na ansiedade para retribuir a indicação, votou sim para Davi Alcolumbre, presidente do Senado, e não para Rodrigo Maia, um declarado desafeto do presidente da República.

Qualquer país que tenha um STF que aceite tratar de temas indiscutíveis, como é o caso, gera insegurança e grave risco à normalidade democrática, demonstrando assim a contaminação ética da Suprema Corte, para a qual foram indicadas algumas pessoas que não mereciam lá estar.

Este debate trouxe à memória o poema de Eduardo Alves da Costa, escrito na década de 1960, minha inspiração para este artigo. Diz o poema:” Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada”.

Essa é a questão: quem tem voz não pode silenciar diante de um fato assim, sob pena de abrirmos espaço para que outras coisas insanas sejam aceitas para análise, e em não havendo mobilização ou manifestação das pessoas, a porteira seja aberta e a boiada das ilegalidades comece a tomar forma e talvez um dia cheguemos a um ponto do caminho em que não há mais volta. Isso vale não somente para o STF, mas precisa ser estendido aos demais poderes, começando pelos municípios, depois Estados e finalmente na esfera federal.

É um direito, e ao mesmo tempo obrigação nossa, a defesa ao direito e à ordem, bases da democracia. Mas, é bom lembrar que para exigir coerência e honestidade dos outros é preciso que você faça um exame de consciência para saber se sua conduta está ética e moralmente correta. Se a resposta é sim, vamos em frente que há muito trabalho à nossa espera.

 

O autor é professor em Nova Santa Rosa

miglioranza@opcaonet.com.br

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