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Elio Migliorança

A TRAVESSIA DO INFERNO

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Estávamos viajando Brasil afora, aproveitando para admirar a paisagem e ao mesmo tempo para refletir sobre a imensidão territorial deste país, sua produção e o que isto gera de arrecadação via impostos. Já havíamos passado por aqui há nove anos e na época tínhamos constatado que o trecho era perigoso, buracos na pista, movimento intenso, sinalização precária e muitas ondulações ao longo do trecho. Claro que nove anos depois, e como “nunca antes na história deste país” se disse que tanto se fez, nós acreditávamos que a estrada tinha sido recuperada e melhorada, considerando que é uma BR estratégica para o país e que os antigos problemas fizessem parte de um passado distante. São 240 quilômetros por onde passa todo o movimento que vem de São Paulo, Goiás, Bahia, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul em direção a Mato Grosso, Rondônia, Acre e Amazonas. É o trecho da BR-163/364, que liga Rondonópolis a Cuiabá. Nossa expectativa era de uma travessia tranquila, segura e com possibilidades de curtirmos a paisagem ao longo do trecho. Planejávamos gastar três horas naquele trecho, para viajar com segurança e tranquilidade. Eram 18 horas, estávamos em Rondonópolis e pretendíamos pernoitar em Cuiabá. Considerando o horário de verão, achamos viável seguir viagem. Nos primeiros quilômetros de estrada foi tudo bem. Logo percebemos que se há nove anos a estrada estava ruim, agora ela estava pior. Além do movimento pra lá de intenso, havia buracos demais e sinalização de menos. Mas nada é tão ruim que não possa ser piorado, então logo começou a chover. Ultrapassar alguém? Quase tão difícil quanto acertar a mega-sena. Os “aloprados” que arriscavam suas vidas e as nossas em ultrapassagens proibidas nos forçaram a sair da pista várias vezes.
Escureceu e o movimento começou a ficar cada vez mais lento. Ao iniciarmos a descida da serra, o caminhão a nossa frente ligou as luzes de alerta e alguns metros adiante parou. Chuva, noite, sem informações que também não teriam ajudado em nada, começou a formar-se uma fila infinita. Foram duas horas e meia de uma longa e angustiante espera. Quando a viagem reiniciou, a situação parecia-se com aqueles vídeos doidos que circulam na internet. À meia-noite chegamos em Cuiabá. Só então soubemos que houvera um acidente com morte. E acrescentaram: “isso é normal neste trecho, acontece todos os dias”. Agora fica a pergunta: onde estão os senhores Blairo Maggi, então governador, e Lula da Silva, então presidente, que não resolveram este problema? Quantas vidas se perderam por conta da omissão de quem arrecadou tanto e não fez o que devia?
Aí está a questão quando se critica a falta de investimentos em infraestrutura, que criam gargalos no desenvolvimento do país e custam milhares de vidas humanas. É a omissão criminosa de quem devia ter feito e não fez. Com tanto dinheiro mal aplicado e tantas obras vitais relegadas a segundo plano, esta falta de infraestrutura no transporte também está na saúde, educação e segurança. Muitas vidas ainda se perderão, porque “político pensa na próxima eleição, só o estadista pensa na próxima geração”.

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