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Editorial

Começamos a errar em 1.500

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O erro começou já em 1.500, com Pero Vaz de Caminha, que descrevia em sua carta a Portugal que as novas terras eram ricas e que nelas, em se plantando, tudo dá. O mensageiro poderia até ter razão naquele momento, para aquelas circunstâncias, mas certamente hoje ele cometeria uma gafe daquelas tão grandes de virar meme em poucos minutos.

O Brasil tem, sim, um rico solo, com abundância de água, propício para a agricultura, para a produção de alimentos. Mas não trate da terra pra ver no que vai dar – ou no que não vai dar. Para se ter uma boa produção é preciso adubar a terra, colocar toneladas de calcário, fósforo, nitrogênio e potássio, entre tantos outros nutrientes que as plantas precisam para se desenvolver e gerar boas colheitas. Não é apenas colocar a semente na terra e rezar para chover.

A agricultura brasileira, em sua ampla maioria, é feita com bastante precisão. As análises de solos, feitas por equipamentos de última geração, produzem mapas perfeitos de cada área. Esses mapas indicam o que, quando, quanto e onde colocar esse adubo, também conhecido como fertilizante. A roça não é para amadores, é para profissionais.

Amadores podemos dizer que são os sucessivos governos brasileiros e as leis que historicamente puxam o freio do agronegócio. Para não dizer que é burrice ou pura ingenuidade, vamos dizer que é um erro estratégico um país poderoso no agronegócio como o Brasil, que depende tanto desse setor, tanto para gerar renda, mas especialmente por produzir comida, não criar mecanismos que auxiliem esse setor. De estratégia, aliás, desde Pero Vaz de Caminha o Brasil sabe bem pouco.

No ano passado, o agronegócio brasileiro usou mais de 40 milhões de toneladas de fertilizantes. Como somos um país muito agrícola, era de se esperar que em solo tupiniquim também fossem produzidos os fertilizantes para nossas lavouras. Mas não. Aqui só foram produzidas seis milhões de toneladas, das mais de 40 necessárias. Para piorar, é possível ampliar essa produção, mas burocracia e um sistema legislativo que insiste em puxar o cabresto do investidor impedem que sejamos menos dependentes dos fertilizantes estrangeiros.

Com a guerra da Rússia na Ucrânia a situação piorou. É que mais de 20% de todo o fertilizante que o Brasil importa vem daquela região. O governo brasileiro, que poucos dias atrás, antes da invasão à Ucrânia, tinha ido até a Rússia para negociar mais fertilizantes para o Brasil, agora começa a atirar para outros lados. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, já está de viagem marcada para o Canadá, outro grande produtor, para tentar uma fatia desse bolo tão cobiçado mundialmente.

Cobiçado porque pode faltar. De acordo com a Associação Nacional de Difusão de Adubos, os estoques no Brasil vão durar só mais três meses. Se nada vier, vai haver falta de fertilizantes para a safra de verão. Se vier pouco, vai ficar mais caro. Quem não comprar, vai produzir menos. Produzindo menos, mais inflação dos alimentos. Começamos a errar em 1.500 e não paramos de errar até hoje.

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