Arno Kunzler
Democracia sem pilares
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Numa democracia, quem dá a estabilidade são, em primeiríssimo lugar, os partidos políticos.
Depois vêm as instituições, Congresso, Judiciário, Ministério Público, imprensa, associações e sindicatos representativos e agora, mais recentemente, as mobilizações de massas feitas pelo WhatsApp.
Ou seriam as mobilizações fatores de instabilidade? Claro que não! Elas representam antes de mais nada o sentimento popular.
Mas a principal ferramenta de uma democracia são os partidos políticos e sua vitalidade.
E aí, convenhamos, vamos entender por que é tão difícil governar o Brasil.
A razão dessa dificuldade é a ausência de regras e autonomia dos partidos políticos.
Não há debate interno e na grande maioria dos partidos não há sequer eleições para escolha dos dirigentes.
A cada episódio mudam-se as regras e os políticos inventam desculpas para mudar de partido.
É verdade que a construção de uma democracia não se consegue em poucos anos; talvez sejam necessárias décadas e várias gerações para que haja, de fato, mudança de hábitos e costumes.
É um aprendizado que precisamos, ou viveremos eternamente com partidos que servem apenas para eleger candidatos e depois serem descartados.
O que está acontecendo no Brasil agora é um caso para ser entendido daqui a dez ou 20 anos.
Jair Bolsonaro não confia no partido que o elegeu e deve ter suas razões.
Também não confia em nenhum dos demais partidos que já existem, aproximadamente 40.
Nosso presidente está convocando os seus aliados, e aí imagino que ele convoca os aliados da base que o apoiaram e não os políticos, para formar um novo partido.
Se quisesse políticos era fácil. Faria um chamamento no Congresso e logo 50 ou 60 deputados o acompanhariam para a nova legenda em troca das benesses do poder.
Mas pelo jeito o presidente não quer partidos no Congresso, ele quer um partido formado por cidadãos comuns, que vão às ruas manifestar e reivindicar.
E essa pressão do povo na rua liderado pelo presidente, organizado num partido político, é que deverá agir e motivar os deputados de outros partidos a votar os projetos que pretende, para mudar o Brasil.
Se dará certo, só o tempo dirá, mas é uma tentativa de quebrar a hegemonia do Congresso, que nas últimas décadas manipula, de forma negativa, nossos governos.
Basta lembrar que Lula criou o mensalão para ter apoio no Congresso.
Sabe-se lá como Fernando Henrique fez para ter apoio do Congresso.
Dilma não fez acordos com o Congresso e, por essa e outras razões, caiu.
Fernando Collor ignorou o Congresso e caiu em menos de três anos.
Temer conseguiu apoio do Congresso para não cair, mas não conseguiu aprovar as reformas que pretendia.
Bolsonaro não quer acordo com o Congresso e está disposto a criar um caminho alternativo para fazer as reformas que prometeu e o povo espera.
Sob o olhar de quem pretende uma democracia estável isso pode ser péssimo.
Ignorar o Congresso ou sufocá-lo com pressão popular, ao invés de se aliar, pode ser ótimo como também pode ser péssimo, depende do resultado final.
Sob o olhar de quem prometeu mudar o jeito de fazer política no Brasil, de quem quer mudar a economia do país e precisa de votos no Congresso sem fazer acordos, pode ser o único jeito.
Todavia, para funcionar será necessário mobilizar grande parte dos brasileiros, convencê-los a defender os projetos e o governo nas ruas.
Se funcionar ótimo, se não funcionar, pena do Brasil.
Arno Kunzler é jornalista e diretor do Jornal O Presente e da Editora Amigos da Natureza
arno@opresente.com.br
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