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Tarcísio Vanderlinde

Abalados pelas surpresas

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É preciso admitir que não é possível prever com segurança as mudanças socioeconômicas que serão implementadas a partir da pandemia do coronavírus. Os próximos meses serão dedicados a um esforço científico no sentido de erradicar ou abrandar a disseminação do vírus. Por outro lado, a convivência com o visitante indesejado não está descartada. O futuro é mesmo imprevisível. Real só o presente, uma vez que até o passado pode nos surpreender com novas interpretações do acontecido.

Como marco a inaugurar o século 21, o atentado de 11 de setembro de 2001 em Nova Iorque ficou esvaziado diante do poder avassalador do coronavírus. Até surgir algo mais impactante, o vírus tomará o lugar de protagonista a inaugurar uma nova fase pelo susto global. É ainda no clima emocional gerado pelo sobressalto que alguns articulistas imaginam como será o mundo depois que o espanto passar.

Matéria recente publicada pelo jornal El País especula sobre o mundo que se formará a partir de algumas práticas já existentes, mas que parecem agora se fortalecer. As práticas deverão se acelerar, sendo que o modelo baseado numa economia consumista deverá ser cada vez mais questionado. No pouco tempo de quarentena adotado compulsoriamente pelo mundo já se observou, por exemplo, uma melhora considerável na qualidade do ar, principalmente nos grandes centros urbanos e industriais do planeta.

Ao lado de efeitos colaterais indigestos, a situação poderá provocar também uma mudança solidária de valores apenas visto em épocas de guerras, experiência ainda pouco compartilhada pela maioria da presente geração. Hábitos de consumo deverão perder sofisticação em benefício daquilo que é considerado essencial. Espaços públicos e de comércio, principalmente em centros urbanos de maior porte, serão reconfigurados. Terão possivelmente utilização mais cuidadosa e racional.

Serviços de entrega que se mostram essenciais neste momento deverão se intensificar e se profissionalizar cada vez mais. Experiências culturais, shows, espetáculos e mesmo viagens adotarão cada vez mais a via virtual em suas imersões. Manifestações religiosas presenciais possivelmente continuarão a existir, mas as experiências espirituais forjadas na quarentena estabelecerão novos parâmetros de reflexão sobre o assunto.

O home office e a busca de conhecimentos a distância, apesar de reservas, se consolidarão mais por necessidade do que por opção. O novo normal parece que está a se materializar. Mas o imprevisível também continuará em pauta. As experiências provocadas pela pandemia poderão desencadear hábitos que nem sequer ainda imaginamos. Nossas projeções costumam partir do que é conhecido, daquilo que se vivencia, no imediato. A surpresa costuma abalar essas projeções.    

 

Tarcísio Vanderlinde é professor sênior da Unioeste

tarcisiovanderlinde@gmail.com

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