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Editorial

O pecado de torcer

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A Copa do Mundo está esse aproximando e trazendo consigo uma enxurrada de bolas nas costas dos torcedores da Seleção Canarinho. Nas redes sociais, quem se manifesta a favor do Mundial ou a favor dos comandados de Tite é massacrado por pessoas que julgam o evento esportivo uma grande perda de tempo. As pessoas escrevem: “as crianças continuam morrendo… falta de hospitais… enquanto você assiste à Copa os governantes estão roubando seu dinheiro… não tem saneamento básico e você aí no sofá assistindo um monte de gente endinheirada correndo atrás de uma bola…”. Como se o fim da Copa do Mundo acabasse com todos os problemas da humanidade! Ou pior: como se o futebol fosse a origem desses infortúnios.

Quando você vai à festa da igreja, não quer dizer que esqueceu da miséria que assola o mundo; quando vai ao teatro, não quer dizer que esqueceu da fome e da sede, assim como quando vai a um jantar com os amigos não quer dizer que esqueceu das guerras e dos desastres naturais. Quando a família viaja de férias, não quer dizer que está lavando as mãos para a falta de empregos, quando o marido presenteia a mulher, não quer dizer que ele não está nem aí para quem nunca ganhou um presente. E quando reserva um tempo de sua vida para curtir a Copa do Mundo, não quer dizer está dando de ombros às necessidades do povo brasileiro. Gostar da Copa do Mundo não é crime. A quem não gosta, existe o direito de não gostar, mas também o dever de respeitar quem se deleita com o mês do Mundial.

Gostar de futebol não é esquecer a corrupção em Brasília. Falar sobre o Neymar não é tirar comida da boca do pobre. Consumir notícias futebolísticas não é esquecer das mazelas brasileiras. Escalar uma equipe não é apertar o botão da bomba nuclear.

Nunca na história desse país as pessoas estiveram tão envolvidas com questões importantes, como política, segurança, preços abusivos. Desde as manifestações de 2013, o brasileiro evoluiu em cidadania e participação. O coletivo ficou mais forte, ganhou mais voz. É um exagero dizer que o gigante acordou, mas já é um primeiro passo para um país em que as pessoas pouco participavam das decisões que mudam seu próprio destino. O povo está mais ligado.

Parece, no entanto, que se você desviar sua atenção para outro assunto o Brasil vai parar na sarjeta, vai sucumbir ao mal e a culpa será sua. As ofensas a quem exprime seu desejo de torcer são alarmantes, preocupantes, desrespeitosas e infundadas. Estão estereotipando torcedores e os colocando às margens do que é ético e importante. Mas sabem, aliás, que a Seleção Brasileira é motivo de unidade entre dezenas de milhões. Mal sabem que ela dá orgulho num país de alma ferida de tanto sofrer nas mãos de seus impiedosos governantes. Mal sabem que faz o tristonho chorar de emoção, que faz o vovô relembrar o tempo passado, que faz o jovem sonhar com vitórias no futuro.

Não precisa gostar, reverenciar, torcer ou sofrer. Basta entender quem torce, sofre, vibra e se emociona. Respeito é a base de qualquer jogo, é a base da convivência social, é a base da vida.

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