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Tarcísio Vanderlinde

Esconderam nas cavernas da Judeia

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No mês setembro de 2023, a Autoridade de Antiguidades de Israel anunciou a descoberta de quatro espadas romanas numa caverna remota do Deserto da Judeia. A descoberta fortalece o rol dos testemunhos sobre a presença imperial romana naquela região nos primeiros séculos da era atual.

O local de difícil acesso da descoberta, revela por analogia, o modus operandi da luta dos judeus contra os romanos. Envolvia como base uma intrincada rede de túneis subterrâneos utilizados como esconderijo, moradia ou para armazenamento de mantimentos destinados a longos períodos de isolamento. As armas encontradas eram provavelmente de espólio de guerra subtraído do exército romano pelos rebeldes da Judeia. Acredita-se que elas foram ocultas para serem utilizadas em momento oportuno contra os próprios romanos.

A datação de aproximadamente 1900 anos dos objetos indica serem remanescentes da segunda grande guerra entre Judeus e romanos, conhecida como a Revolta de Bar Cohba (líder do levante) de 132 a 136. Calcula-se que 600 mil judeus morreram nessa revolta. A insurreição foi mais um dos trágicos capítulos da história do povo judeu no período reconhecido como o da Era Cristã. Diante da frustração decorrente da destruição do templo e da cidade de Jerusalém 60 anos antes, o levante acabou adquirindo um forte apelo messiânico.

O historiador Efraim Rushansky observa que “o caráter messiânico da revolta de Bar Cohba coloca frente à comunidade dos judeus crentes um sério dilema, pois as sucessivas vitórias dos judeus nos primeiros meses da revolta coincidia com a expectativa do ‘messias guerreiro e libertador’ que o povo judeu tanto esperava”.

O exército romano, entretanto, sob o comando do general Julius Severo, soube resistir às táticas de guerrilha dos judeus. Ao final do conflito, a população da Judeia praticamente deixou de existir. O líder foi preso, julgado, decapitado e sua cabeça enviada ao imperador Adriano, em Roma. Entre as ações punitivas após a guerra, os romanos renomearam a província da Judeia para Palestina (Terra dos Filisteus) em homenagem aos ancestrais inimigos dos judeus na época dos reis de Israel.

Palestina permanece em pauta no tempo presente, assim como Israel, que, sob aprovação da ONU, ressurge em ambiente conflituoso como Estado em meados do século XX. Diversos conflitos entre judeus e árabes têm marcado a história recente de Israel e seus vizinhos, principalmente os palestinos. A ação que pegou Israel de surpresa no dia 07 de outubro foi planejada pelo grupo islâmico radical Hamas, considerado a maior organização islâmica dos territórios palestinos. O Hamas, fortalecido por vínculos externos, é contrário à existência do Estado de Israel, ou a um eventual acordo de paz que essa nação possa celebrar com outros países árabes. A entidade é considerada um grupo terrorista por diversas democracias do mundo.

Normalmente se sabe como uma guerra se inicia. Dificilmente se sabe como termina. No caso de israelenses e palestinos, a guerra parece ter caráter intermitente, como um rio que às vezes seca e depois volta a correr. Por outro lado, é curioso perceber que o último ato do Hamas não conta com apoio consensual de toda a população palestina, hoje dividida em dois territórios: Gaza e Cisjordânia. Existem duas Palestinas de fato, representadas por lideranças que são politicamente adversárias.

A história da região é complexa. Avaliações apressadas podem logo ser esvaziadas pela enxurrada de contraditórios que têm aparecido nas redes sociais ou em artigos considerados especializados sobre o assunto. No momento em que concluo o texto, já se percebe o potencial de um segundo front do conflito na fronteira de Israel com o Líbano e Síria. Por enquanto, parece haver pouca disposição para discutir condições de um cessar fogo.

Alto relevo no interior do Arco de Tito, em Roma. A escultura enaltece a destruição de Jerusalém e do Templo pelos romanos. Observe-se a menorah – candelabro sagrado do Templo -, sendo levado em triunfo pelos invasores (Foto: acervo pessoal)

Por Tarcísio Vanderlinde. O autor pesquisa sobre povos e culturas do Oriente Médio.

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