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Urbano Mertz

Cultura e pertencimento

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Em muitas sedes municipais da região encontramos os enormes dizeres “Eu amo este município”. Para muitos pode parecer caricato, mas estes dizeres propõem às pessoas que este lugar merece ser amado, porque é bonito, tem um bom nível de vida, não tem violência e é, enfim, um lugar onde as pessoas podem ser felizes.

Pessoas felizes, e que amam o lugar onde moram, certamente valorizam amizades e cultivam valores humanos, traduzidos pela solidariedade, respeito, justiça e empatia com os demais membros da sociedade. Mas, para que uma sociedade carregue todos estes valores, é necessário que haja espaços e condições para que os cidadãos desenvolvam o seu potencial de cultura.

Cultura não é educação formal, em que os jovens aprendem estratégias para vencer na competição da vida; não é religião, não é esporte e também não é simplesmente assistir uma apresentação de danças típicas. São valores adquiridos com a reflexão crítica sobre a sociedade em que se vive e que somente se expressam através das artes e da interação social.

Espaços para o aprendizado e para a expressão de manifestações culturais através da música, de teatro e da exposição de artes plásticas são necessários para que as pessoas reflitam sobre a sua realidade e preencham os seus vazios existenciais, que, de outra forma, são preenchidos pela constante busca de satisfação através do consumo de bens materiais.

A cultura liberta as pessoas dos preconceitos sociais, da intolerância e do egocentrismo. A cultura promove a dignidade e o crescimento intelectual dos seres humanos, embora cidadãos dignos e com opinião própria podem não ser bem vistos por setores da sociedade, que almejam o seu controle por motivos políticos, religiosos ou de mercado. 

Já dizia um ministro de Hitler: quando ouço falar em cultura, tenho vontade de puxar minha arma!

Ouve-se, vez por outra, que construir um teatro ou um centro cultural é desperdício de dinheiro público. Que este recurso seria melhor empregado na construção de uma ponte ou de postos de saúde. Sim, isto tudo pode ser importante, mas, como diz a música dos Titãs: “A gente não quer só comida. A gente quer comida, diversão e arte! A gente não quer só dinheiro, a gente quer dinheiro e felicidade”.

Todas as sociedades desenvolvidas têm amplos espaços para apresentações e dispendem muitos recursos públicos para que os cidadãos tenham acesso a bons espetáculos culturais. Neste sentido, o município também deve investir na formação cultural da sua juventude, para que ela possa desenvolver os seus dons artísticos, através da dança, do teatro, da música, da escultura, da pintura, do cinema, do canto, etc. Isto tudo contribui para a redução da violência e da marginalidade e incrementa os indicadores de bem-estar do município.

Já há alguns anos o município de Marechal Cândido Rondon aguarda a conclusão de um anfiteatro para apresentações culturais, anexo uma Casa de Cultura e salas para oficinas de artes. Está previsto que este espaço seja nomeado em homenagem a um grande artista rondonense, o senhor Hédio Strey. Músico, escultor e construtor de instrumentos musicais, Hédio Strey certamente merece esta homenagem pela sua dignidade e pela sua autenticidade como artista, que buscava nos elementos regionais os motivos para sua obra.

Pertencer a um lugar é se identificar com este lugar e conhecê-lo profundamente: as pessoas e os seus costumes, as suas paisagens naturais, a sua geografia, a sua história e os seus lugares históricos. Enfim, este conhecimento desenvolve o pertencimento ao lugar onde se vive e pode servir de referência e fonte de inspiração para a expressão artística.

A arte reinterpreta as pessoas e a sua realidade, e discute os valores necessários para se viver em um mundo que se transforma rapidamente. Por isso, não se pode dizer que investimento em cultura é desperdício, mas é contribuição dos governos para a construção de uma sociedade mais justa, mais humana e feliz.

Assim, o dizer “Eu amo este município” dá um significado concreto à mensagem que se quer passar aos munícipes, isto é, o de pertencer a um lugar onde a cultura é valorizada e isto contribui para a felicidade das pessoas.

Por Urbano Mertz. Ele é engenheiro agrônomo, vice-presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário de Marechal Cândido Rondon e inspetor do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR)

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