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Fátima Baroni Tonezer

Vamos falar sobre suicídio? A linguagem silenciosa e prevenção

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A melhor forma de falar de algo tão sensível é buscar uma linguagem direta e clara. E estabelecer uma conversa contínua, para alertar, informar e prevenir. O suicida algumas vezes acaba concretizando o ato, a vontade, não por falta de trabalho ou de família ou coisas similares. Eles são afetados pela falta de empatia das pessoas ao redor. Eles se desconectam do mundo de uma forma tão profunda que nada mais parece fazer sentido ou valer a pena. E aí o bullying, a falta de escuta, a depressão, uma pessoa adoecida acaba perpetuando o ato. A Organização Mundial de Saúde (OMS) informa que 90% dos suicídios são previníveis. E que é preciso é olhar para os transtornos mentais. Há estatísticas mostrando que 97% dos suicídios, de acordo com os prontuários médicos/obituários, apontam para transtornos mentais, quadros psiquiátricos maltratados ou não tratados.

Se esmiuçar esse percentual, vamos perceber que dentre esses transtornos, os principais são transtornos afetivos – transtornos de humor bipolar e depressão. Também há o uso e abuso de substâncias psicoativas. E se juntar os transtornos bipolares e depressivos com uso dessas substâncias, teremos 60% das causas.  Temos também pessoas com transtornos de personalidade Bordeline, esquizofrenia, transtornos de ansiedade e alimentares entre outros transtornos.

É importante colocar esses dados estatísticos reais quando se fala desse assunto porque não podemos mais esconder e fingir que não acontece. Ou ficar atrás da falácia que noticiar um suicídio estimula outros. Para diminuir as taxas que estão crescendo, precisamos falar sobre o tema com responsabilidade. Não falar sobre é prejudicial já que a negação nunca resolveu problemas. O caminho até o suicídio passa por sofrimento, até o ponto em que a pessoa está cansada, não de viver, mas da dor. É importante saber disso, porque quando ouvir de uma pessoa “estou cansada de viver”, “não suporto mais essa vida”, “a vida não tem sentido” é importante escutar que ela está falando de uma dor, que está cansada dessa dor e não da vida.

COMO PODEMOS IDENTIFICAR SINAIS?

Primeiro é preciso deixar o preconceito de lado. Quem pensa e busca essa saída não está desvalorizando a vida e nem é covarde. Essa pessoa está doente e precisa de ajuda, de tratamento. Já temos identificado alguns sinais de comportamento que alertam para a possibilidade.

OS SEIS “D’s” QUE SINALIZAM A IDEAÇÃO

Podemos identificar seis “D’s” que acompanham a ideação suicida: Desespero; Desesperança; Delirium (causado pelo uso de álcool e drogas); Desamparo; Depressão e Dependência Química. Esses seis “D’s” causando dor psíquica insuportável estreitam a visão que a pessoa tem da vida; vê a vida toda em cinza e o suicídio aparece como única alternativa. E essa situação não tem a ver com falta de fé, tem sim a ver com o estreitamento cognitivo, isto é, a pessoa só pensa naquilo, na dor e na falta de perspectiva e na saída para aliviar a dor.

NO MOMENTO QUE A PESSOA EFETIVA O ATO, PESQUISAS COM OS SOBREVIVENTES MOSTRAM QUE ALGUNS SE ARREPENDEM

A forma de prevenir é estar atento às falas, aos sinais visíveis ou não, conversar, levar para ajuda especializada. E é importante ressaltar, não é porque é médico, enfermeiro, psicólogo, religioso, policial ou bombeiro, que todos sabem lidar com a situação. É preciso preparo, isto é, descontruir crenças, mitos e preconceitos é essencial e urgente. Entender que até chegar ao dia fatal, ao ato fatal, muita coisa foi falada, muitos sinais emitidos.

O suicida não é covarde, a culpa não é dele, não é brincadeira para chamar a atenção.

É preciso falar sobre o suicídio, alertar e educar. E cuidar do que estão espalhando por aí, as redes sociais estão potencializando o problema. Infelizmente é possível encontrar “dicas” de como perpetuar o ato, um verdadeiro passo a passo macabro, com desafios e estímulos criados por mentes doentes. Porém, tem outra forma tão cruel quanto. Seja pelo padrão e oferta de perfeição, seja pela riqueza instantânea, onde vale tudo, vender promessas vazias para ganhar dinheiro sem se importar com o outro lado, com a autoestima baixa, os problemas de personalidade ou transtornos mentais.

ÚLTIMO ATO DE DESESPERO, MAS PROÍBIDO DE SER FALADO

Resgatar o diálogo, seja na família seja no social. Em tempos de internet, significa sair para encontrar pessoas, sentar-se na grama, no banco da praça ou num café e conversar. E evitar um problema atual que é a polarização, “se você não concorda e não fala a minha linguagem, você é meu inimigo”. Vivemos a era do monólogo – só aceito aquilo que é igual, não permito sequer pensar diferente. Criar redes de apoio – família, amigos, profissionais da saúde, espiritual – sem julgamentos e cobranças.

As mídias devem informar, não noticiar, isto é, expor o que aconteceu com riqueza de detalhes e exaustivamente, método usado etc. É situação análoga às tragédias em escolas ou sequestros, ao expor continuamente nas mídias, com riqueza de detalhes e mostrando a foto, dá palco para pessoas doentes ou maldosas perpetrarem tragédias. Divulgar que aconteceu, não como aconteceu ou mostrando quem fez. No caso dos assassinatos, ostracismo e lei. No caso do suicídio, alerta, sem expor a pessoa ao julgamento alheio. Informar e divulgar os meios de proteção, tratamentos indicados, como, por exemplo, autoestima equilibrada, psicoterapia com psicólogo, tratamento com psiquiatra, bom suporte familiar, espiritualidade. Criar laços é fundamental.

E lembrar que tem a questão da doença mental, que precisa ser identificada e tratada adequadamente. Desenvolver em si mesmo e nas pessoas próximas e nas crianças um fator que foi fundamental para nossa evolução enquanto humanos, a adaptabilidade (também conhecida como resiliência). Ah! E a atividade física é outro fator de proteção.

Apesar da dor que esse assunto traz, da falta de diálogo pelo preconceito e julgamento, das informações truncadas, é preciso falar, estabelecer conversas que geram conhecimento e acolhimento. Criar redes de apoio, tanto na área da família, na saúde, na educação e na sociedade.

No próximo artigo, vamos falar um pouco mais sobre esse tema, olhando para o que está por trás dele. Vamos olhar para estigma e preconceito? Fica comigo, continua me acompanhando, pelo Jornal O Presente e nas minhas redes. E se quiser trocar uma ideia sobre esse ou qualquer outro tema, me chame.

Até a próxima,

Fátima Sueli Baroni Tonezer é psicóloga, formada em Psicologia na Universidade Estadual de Maringá (UEM). Sua maior paixão é estudar a psique humana. Atende na DDL – Clínica e Treinamentos – (45) 9 9917-1755

@psicofatimabaroni

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